Olá Letícia Torres e Mente Purificada
Darei minha contribuição: pelo que vejo no meu coração, a busca pela felicidade baseado em razões exteriores nunca tem sucesso. Apenas em razões exteriores, pelo menos, essa busca nunca termina. E se alguém consegue parecer contente nessa condição, seja para os outros ou para si mesmo, é mais porque isso funciona como um disfarce de uma insatisfação interior, ou porque a pessoa realmente está feliz, mas é sempre temporariamente, por pouco tempo.
Porque a felicidade baseada em condições externas oscila junto com as condições externas, e nenhuma condição externa é eterna. Se gosto do frio, assim que esquenta um pouco me irrito. Se gosto do meu emprego e, um dia, por ventura, eu for demitido, provavelmente me sentirei muito frustrado. Vamos oscilando conforme as mudanças externas, porque nosso refúgio e nossa segurança sempre estão lá fora, e nunca no nosso interior.
Agora, o que significa refugiar-se no interior? Podemos dizer que significa valorizar mais as intenções e atitudes que você cultiva, em vez de valorizar os pertences ou experiências que você usufrui.
Isso é muito mais interessante, porque, a felicidade que depende de experiências ela é muito frágil. Para sustentá-la, temos que tentar sustentar as experiências que gostamos e evitar as que odiamos, mas é impossível fazer com que o mundo ou as pessoas sempre sejam do jeito que queremos. E por isso essa felicidade nunca dura muito.
Agora, a felicidade que depende do que nós cultivamos é muito mais fácil de despertar, porque depende das nossas escolhas INDEPENDENTE do que estivermos experimentando lá fora, ou dos pertences que tivermos ou deixarmos de ter.
Não é algo tão fácil de entender - é algo para se investigar na própria mente, na prática. Mas é uma verdade.
A felicidade que vem de você cultivar coisas boas, é algo que você pode despertar em si mesmo independente do que você estiver experienciando, porque não é uma felicidade baseada em experiências externas ou mesmo internas! É algo muito interessante. Você pode despertar uma paz e uma aceitação no seu coração, mesmo que interiormente haja um sentimento de agonia, de raiva ou ansiedade. É quase como se coexistisse uma paz interior junto com todas as outras manifestações emocionais do nosso coração. Essa paz vai observando todas essas manifestações cessarem, sem se agitar. Algo que costumo dizer a mim mesmo é: "uma mente frugal, com poucas necessidades, que se satisfaz com qualquer coisa, é muito difícil de agitar". Quer dizer que uma mente pouco exigente, que acolhe qualquer coisa que se manifeste e é capaz de aguardar pacientemente qualquer coisa que surja passar a seu próprio tempo, é uma mente que sempre está contente.
Mesmo que venham pensamentos de remorso, palavras ofensivas, experiências dolorosas, perdas no mundo, ou emoções desanimadoras, uma mente treinada em meditação é capaz de acolher todas essas coisas sem aversão, e continuar fazendo o que é benéfico fazer enquanto deixa que essas coisas passem a seu próprio tempo, sem ficar se envolvendo com o desejo por algo diferente do que está presente. Liberdade da cobiça e da aversão - isso é libertar-se dos 2 lados do Desejo, o Desejo por ser/existir e o Desejo por não-ser/existir. Isso é Desapego, Equanimidade. A capacidade de deixar que as coisas venham e vão sem se envolver com elas, cultivando somente aquilo que é para ser cultivado, que é generosidade, energia, alegria, contentamento, moderação, equilíbrio, solidariedade, entre outros.
Dois versos do Dhammapada que eu sempre repito:
A paciência é a suprema ascese, - DHP 184 - http://www.acessoaoinsight.net/dhp/dhp14.4.phpcontentamento é a maior riqueza, - DHP 204 - http://www.acessoaoinsight.net/dhp/dhp15.8.php
Porque paciência é essa capacidade de aguentar, aguardar, deixar as coisas virem e irem sozinhas. Sempre que a gente se esforça demais para fazer algo passar, ou fazer algo surgir, nós sempre estamos nos baseando em desejos... Desejos de se sentir de uma determinada maneira, ou desejo de evitar a experiência presente... É sempre desejo de que seja diferente, sempre inquietação, ansiedade, cobiça, aversão...
O que o Buddha quer dizer quando ele fala em Esforço Correto no Nobre Caminho Óctuplo, é esse esforço de não fazer nada a não ser desapegar, deixar passar, e seguir com nossos afazeres benéficos. Fazer nossas tarefas rotineiras, deixando que essas coisas venham e vão sozinhas. E é necessário esforço para isso, porque nós não queremos ou não aguentamos deixar que essas coisas vão sozinhas. Queremos fazer algo a respeito. Queremos intervir. Queremos controlar. Aí os professores de meditação vêm e falam sobre "Não-controle" e nós não entendemos rsrs... É sobre isso. Sobre Paciência. Deixar vir e ir. Paciência é a maior ascese porque deixar as contaminações virem e irem, sem se importar com elas, é o que mais as destrói.
Por isso que eu sempre pergunto: o que é preciso para praticar o caminho do Buddha? Ou, o que é preciso para praticar generosidade? Para fazer algo bom? Para ser uma boa pessoa? Do que precisamos?
Uma casa nova? Uma família? Melhores amigos? Um teto? Um emprego bem remunerado?
No fundo não precisamos de muita coisa. Há pessoas em dificuldades ou em condições rasas que dão sorrisos tão bonitos. Há comunidades pobres em que as pessoas são tão caridosas umas com as outras. Há pessoas desempregadas achando carteiras perdidas pela rua e, apesar da necessidade, são honestas e devolvem a carteira com dinheiro.
Então, do que precisamos para sermos boas pessoas?
Porque felicidade interior, felicidade que realmente têm valor, é a felicidade que vem de ser uma boa pessoa e de treinar a mente e o coração. Do que precisamos para fazer isso?
Não é fácil entender isso, mas se investigarmos, pouco a pouco vamos vendo que quando temos paz no coração, nunca estamos sozinhos. E que mesmo que não tenhamos pessoas que nos amem a nossa volta, ainda somos capazes de amar todos os que estão a nossa volta, porque a nossa verdadeira família são todos os seres. Porque em todos nós, está esse potencial para cultivar o que é bom. Se vemos isso em nós, vemos nos outros. Se vemos isso nos outros, é impossível não amar todos os seres. Então entendemos a capacidade de amar sem esperar nada em troca.
Ou de abrir mão, sem esperar algo de volta.
De abandonar, de perder, de falhar. Entendemos que o essencial não é ter sucesso. O sucesso, é cultivar bondade. Só que entender isso é difícil, e é só à medida que investigamos e aprendemos isso, que somos capazes de encontrar essa felicidade interior que consegue nos permear mesmo que não tenhamos todas essas coisas que você citou.
https://www.youtube.com/watch?v=8gutp4_c3V8
Neste vídeo um monge tibetano fala sobre felicidade. Ele inclusive fala sobre esse elemento que comentei, de uma paz que é capaz de estar mesmo com a felicidade ou com a tristeza. Porque na verdade o caminho do Buddha não é para alcançar felicidade, é para alcançar a paz. Não há felicidade que seja mais satisfatória do que a paz.
A maior satisfação de todas é estar em paz. Eis uma pegadinha para investigar no coração rsrs