- Durkheim escreveu:
- Baseado no que li aqui no fórum, é possível atingir a iluminação mesmo não sendo um monge. Mas já houveram leigos que atingiram a iluminação? Ou talvez, especificando melhor, já houveram pessoas que mesmo não largando a vida em sociedade se tornaram iluminados? Entendo que mesmo que não tenha havido nenhum, não quer dizer que não possam existir futuramente. Mas já houveram?
Olá Durkheim, já houve leigos que atingiram a Iluminação sim, mas os Iluminados não costumam se declarar por aí "Ei, eu atingi a Iluminação!", então é difícil dizer rsrs...
No entanto, há muitos leigos hoje em dia que se declaram Iluminados, mas é meio complicado isso. Iluminação é algo mais difícil do que dizem por aí, mas não tão inalcançável quanto imaginamos. Eu lembro de já ter visto o livro de um professor espiritual dos EUA, se não me engano, e na capa do livro consta o título do livro, e o nome dele aparece como "O Arahant Fulano de Tal", ou seja, ele se declara um Arahant. Isso é bem complicado.
Primeiramente, como eu disse, os Iluminados não costumam declarar suas conquistas por aí. Então, as referências que temos geralmente vêm dos Suttas, porque o Buddha era o único que reconhecia quando quisesse qual era o nível espiritual de alguém. Então, quando alguém morria, ou quando alguém entendia um ensinamento, o Buddha dizia - "Fulano tornou-se Sotapañña após ouvir esse ensinamento... Cicrano, que acaba de falecer, renasceu nas moradas divinas pois alcançou o estado de Anagami... Beltrano, que acaba de falecer, não mais renascerá pois alcançou o estado de Arahant..." e assim por diante. Então, os discípulos que escreveram os Suttas registraram esses depoimentos do Buddha, indicando os estados que cada um alcançou, e há Suttas relatando o atingimento de Arahant, da Iluminação, de alguns discípulos leigos, como Bahiya.
Mas só um Buddha é capaz de apontar o nível de outro ser. Mesmo um monge que desenvolva a capacidade de ler a mente dos outros não tem esse potencial - ele pode chegar a uma dedução após muito tempo observando a mente de alguém, talvez, mas ele não pode saber de imediato o nível de alguém quando quiser como faz um Buddha. Então, só o Buddha podia fazer isso.
Como exemplo, existiam dois irmãos discípulos do Buddha os quais o Buddha apontou tendo alcançado Sakadagami (o segundo nível de Iluminação), sendo que um era celibatário e o outro era sexualmente ativo. Então, aparentemente, um é mais "elevado" do que o outro, mas na verdade ambos haviam alcançado o mesmo nível de iluminação - só um Buddha para dizer qual nível um ser alcançou ou não.
Então, esse negócio de "níveis" de iluminação é muito complicado. Só alcança o primeiro nível de Iluminação aquele que reconheceu o perigo no desejo por ser/existir, que reconheceu o perigo do orgulho, e ainda assim vemos muitas pessoas por aí desejando declararem que são iluminadas, ou que chegaram à "consciência imortal", mas o ensinamento do Buddha é sobre vazio, não-eu, abandono, ser discreto, não depender da opinião dos outros, então tem que tomar cuidado quando se vê pessoas por aí declarando que conquistaram isso ou aquilo.
A essência do ensinamento do Buddha é "quando isto é, aquilo surge. Quando isto não é, aquilo cessa. Portanto, forma, sensações, percepção, formações mentais e consciência são não-eu" e ainda assim há pessoas declarando-se iluminadas apenas para elevarem o seu apego a um Eu que elas formam, que se identificam, então é um negócio complicado.
O Buddha proibiu os monges de declararem o seu nível de realização para os leigos, porque quem não conhece bem a si mesmo pode achar ser mais do que realmente é e sair declarando mentiras.
Então, talvez o melhor é não pensarmos muito nisso, cultivarmos esse Dhamma no melhor das nossas habilidades e cultivar bem no fundo do nosso coração essa paciência que diz: não importa se eu sentir melhoras ou pioras, não importa se surgirem dificuldades ou inspiração, não importa o quanto esses opostos se revolvam e se alternem um após o outro, eu continuarei cultivando esse caminho e deixarei que os frutos venham a seu próprio tempo. Que os frutos venham a seu próprio tempo - não vou praticar apenas quando me sentir inspirado ou quando achar que não está havendo mais nenhuma piora. O que quer que surgir na mente, eu irei acolher, irei contemplar e usar isso por generosidade, se for possível, ou deixar que isso passe, se não for útil. E é só. Assim vamos regando o jardim e deixando que ele floresça a seu próprio tempo. Cada um de nós tem o seu próprio Karma, cada um de nós tem o seu próprio tempo. O que podemos fazer é cultivar de acordo com os ensinamentos do Buddha e deixar que floresça a seu próprio tempo. "Quanto mais pacientes somos, mais rápido avançamos"
Mas se eu escrevi muito, é porque essa questão é muito complicada para ser simplificada. Um leigo pode alcançar a Iluminação, conforme foi afirmado pelo Buddha inclusive, só que devemos usar como referência os Suttas e não as várias pessoas por aí que se declaram Arahants. O entendimento que se adquire só no primeiro nível de iluminação (Sotapañña), já é totalmente diferente do que as pessoas costumam achar... Imagine o nível de entendimento do quarto nível (Arahant iluminado) então rsrs... Sem considerar o 4º nível de iluminação, vamos pegar leigos da época do Buddha que alcançaram o 3º nível (Anagami). Tinha uma discípula Anagami, como exemplo, cujo filho foi morto pelo rei na sua frente, e ela nunca demonstrou raiva ou tristeza... Os Tinha outro discípulo que tinha 4 esposas e que quando atingiu Anagami declarou as 4 que não tinha mais como continuar como marido delas, e que elas podiam fazer o que quisessem e tratá-lo apenas como irmão. Tinha outro que vendia não lembro o que agora, mas que ele só trocava seu trabalho por alimento - ele evitava trabalhar por dinheiro. Então, existiram discípulos leigos Anagamis que eram pessoas realmente incríveis, com qualidades que é difícil você ver no mundo... Se isso é ser Anagami, imagine o que é ser um Arahant totalmente iluminado... Então é melhor não brincar com essas coisas rsrs...
Melhor deixar essa questão de lado, e seguir em frente... Mas lembre-se que leigo x monge são apenas convenções, sendo que a segunda é apenas mais favorável que a primeira, mas que no final das contas esse caminho espiritual refere-se a mente, ao coração, e isso pode ser desenvolvido por qualquer um... mas a seu próprio tempo - a seu próprio tempo