O Budismo como uma Aula de Química
O Budismo consiste num conjunto de conselhos que você deve colocar em prática e ver no que eles dão. É como uma receita que te passa as instruções para você fazer seu próprio alimento por si mesmo.
Essa é uma dúvida não só comum a quem está conhecendo o Budismo, mas também a quem decidiu seguir tal religião, visto que muitos budistas podem ser questionados por outras pessoas: "Sobre o que fala o Budismo?". Essa, na verdade, é uma pergunta cruel. Você não pode compreender o Budismo com um resumo teórico, você precisa praticá-lo. Entretanto, se alguém quiser tirar de você uma ideia sobre o que é essa religião, vamos ver algumas.
Primeiramente, o Budismo é uma religião e filosofia muito profunda, complexa, sutil e sábia. Devido a sua vasta rede de ensinamentos, essa religião pode ser resumida de várias formas. Muitos dizem que o Budismo fala de como se libertar do sofrimento, outros preferem resumi-la como uma "Ciência da Mente" ou alegar que ela indica o caminho para a Paz. Todas essas sínteses são corretas e, aqui, compartilharei mais uma que consistirá num símile que me surgiu espontaneamente. Friso, mais um vez, que qualquer resumo ou sinopse sobre o Budismo é uma limitação. No final das contas, o Budismo aponta para as nossas experiências - apenas palavras não podem exprimir o que o Budismo passa.
Mais uma forma de resumir o Budismo: uma aula de química. Ser budista é como ser aluno de um professor de química chamado Buda. Esse, tendo descoberto como misturar, reagir e transformar substâncias para fazer uma mistura doce, nos dá uma aula de como fazer o mesmo que ele fez. Ou seja, o Buda descobriu o caminho para experimentar o sabor da Paz Interior e, assim, ele compartilha conosco como podemos degusta-lo por nós mesmos.
Todos já temos os mesmos instrumentos que ele usou: alguns frascos, substâncias reativas e químicas. Num sentido real, todos temos os mesmos instrumentos de pesquisa psicológica e espiritual que o Buda possuía: um corpo e uma mente.
Assim, o que o professor faz é apenas indicar como devemos usar esses instrumentos. Então, vamos tentando por nós mesmos obter um sabor com uma exatidão doce, porém suave. Ora obtemos um sabor azedo, ora amargo, ora doce demais, ora sem gosto. Da mesma forma, nós tentamos colocar os ensinamentos do Buda em prática por nós mesmos. Às vezes conseguimos um pouco de paz, às vezes ficamos mais furiosos, ora ficamos contentes e logo estamos ansiosos. Entretanto, passar por todos esses sabores é necessário.
Aliás, às vezes ficamos tão furiosos que pensamos que o professor na verdade não sabe de nada. Mas então olhamos para a substância feita por ele e percebemos que todas as misturas tentadas não chegaram à aparência da substância que ele obteve - isso é uma comparação quanto ao aspecto superficial. Muitos de nós entestamos com momentos em que perdemos a confiança no Buda, pensando que ele ensinou coisas que não podemos alcançar ou mesmo que ele só contou mentiras. Mas aí olhamos para ele, ou melhor, para os seus seguidores e vemos, pelas aparências, que eles manifestam uma paz que ainda não compreendemos. Assim, vemos que na verdade somos nós que estamos errando. Não adianta culpar o professor - tente de novo!
Então, continuamos tentando várias misturas. Podemos ajudar os outros alunos, mas no final das contas cada um deve experimentar o sabor de sua própria substância por si mesmo - ninguém pode dizer se ela está doce ou não por você, cada um com o seu próprio paladar: você terá de degusta-la e procurar compreender o que deve ser feito. Da mesma forma, não podemos esperar que os outros digam se estamos praticando corretamente ou não. As outras pessoas podem nos ajudar até certo ponto a melhorar a prática, mas é apenas você quem pode perceber o que se passa na sua mente e decifrar qual a melhor atitude a ser tomada interiormente.
Não adianta você ficar nervoso porque uma mistura explodiu ou não atingiu a cor desejada. O modo mais rápido de conseguir o sabor almejado é tentar de novo e de novo sem reclamar no meio do caminho. Nossa prática, assim, deve ser realizada pacientemente e constantemente. A paciência é o caminho mais curto - não devemos desanimar com os erros que são importantes para realizar a iluminação.
O aluno não deve ficar focado nos livros. Ele pode decorar toda a teoria passada pelo professor, ter decorado a velocidade para misturar os elementos, entre outros, mas ainda assim ele não sentirá o sabor doce que o professor sentiu. Logo, não devemos ficar atados às palavras de Buda. Devemos coloca-las em prática. Não estamos aqui para ler sobre o Nirvana, mas para realiza-lo e vive-lo.
Quando o sabor doce for, enfim, desenvolvido, nada mais haverá para ser feito. Você poderá ajudar outras pessoas a chegarem até esse sabor mas não deverá interferir na prática deles - cada um precisa pôr a mão na massa por si mesmo. E, quando chegar o final da aula, você poderá sair dela com sua tarefa terminada, sem precisar voltar às próximas. Ou seja, quando você alcançar Nirvana, você poderá ajudar os outros de forma mais sábia e eficiente, mas ainda deixando que eles trilhem o caminho, pois o sabor deverá ser experimentado por eles mesmos. E, quando a sua vida chegar ao fim, como a tarefa já foi terminada, você não precisará voltar para nenhuma outra. "O que devia ser feito foi feito, não há mais vir a ser nenhum estado".
Se você ainda está conhecendo o Budismo, saiba que essa é uma boa forma de resumi-lo: o Buda indicou como usarmos as nossas mentes, então testamos esses conselhos por nós mesmos para tentar encontrar a paz.
Se você se ver em situações em que as pessoas te perguntarem sobre o que é o Budismo, eis aqui um conselho para que você possa esclarecer o que tal religião significa, teoricamente, ou melhor, para o que ela aponta.
No final das contas, o mais importante de toda essa comparação é você se lembrar de que uma pessoa não pode saber como é uma aula de química se ela não for até lá. Não adianta você falar sobre a aula de química para seu amigo se ele nunca assistiu uma! Ele pode ler e saber todas as informações sobre uma aula de química mas, sem ter participado de uma, ele não terá sentido o que isso de fato é.
Então, no final das contas, há várias formas de resumir o Budismo. Mas, se alguém te perguntar "Sobre o que fala o Budismo?", você pode compará-lo a uma aula de química para facilitar a compreensão de quem pergunta, mas lembre-se de ressaltar que qualquer síntese teórica do Budismo não pode apontar de fato o que consiste essa prática. Se o seu interlocutor quiser saber de fato o que é o Budismo, diga a ele que ele terá que colocar os ensinamentos em prática e tentar misturar as substâncias de acordo com o que foi sugerido nos escritos budistas - e não adianta decora-los. Você pode falar um pouco para ele sobre o sabor de procurar a paz, o sabor doce e sublime, mas esse sabor não terá graça alguma a menos que ele seja experimentado, sentido por ele mesmo, adquirido pelo esforço próprio.
Então, voltamos ao começo. Há como resumir o Budismo? Há. Mas isso é inútil, porque um resumo nunca traz a compreensão total.
Portanto, como resumir o Budismo? Como uma aula de química. Agora, como compreendê-lo? Indo até ela para tentar adicionar as suas próprias misturas, isso é, seus pensamentos benéficos, e assim obter a sua própria substância: uma mente treinada e desapegada. Com isso, vem o sabor doce: a Paz Suprema.
Você pode saber a fórmula química da água e todas as suas propriedades, mas a menos que você a beba, sua sede nunca será saciada.